
Tópico VI – Variação linguística
Que a língua não é um sistema invariável e uniforme já sabemos, embora, nem sempre, aceitemos facilmente esse caráter de mutabilidade das línguas como um processo natural e inerentemente válido. Qualquer atividade de interação verbal envolve situações e sujeitos diversificados, marcados por especificidades individuais e coletivas, que, naturalmente, vão manifestar-se no modo de falar, no padrão de escolha das palavras e das estruturas gramaticais. Perceber tais variações como um processo natural das línguas é desenvolver a capacidade de perceber como legítima a atitude do sujeito de recorrer a variações de usos para adequar-se às condições particulares de cada situação. Numa perspectiva bem mais ampla, recorrer a variações representa o reconhecimento da língua como manifestação das diversidades culturais; representa, ainda, o respeito pelo estatuto de igualdade de todos os cidadãos frente ao exercício da faculdade da linguagem.
Descritor 10 – Identificar as marcas linguísticas que evidenciam o locutor e o interlocutor de um texto
Por meio de itens deste descritor, pode-se avaliar a habilidade de o aluno identificar quem fala no texto e a quem ele se destina, essencialmente, pela presença de marcas linguísticas (o tipo de vocabulário, o assunto etc.), evidenciando, também, a importância do domínio das variações linguísticas que estão presentes na nossa sociedade. Essa habilidade é avaliada em textos nos quais o aluno é solicitado a identificar o locutor e o interlocutor nos diversos domínios sociais, como também são exploradas as possíveis variações da fala: linguagem rural, urbana, formal, informal, incluindo as linguagens relacionadas a determinados domínios sociais, como cerimônias religiosas, escola, clube etc. Com este item, podemos avaliar a habilidade do aluno em identificar as marcas linguísticas que evidenciam o domínio social, ou seja, o ambiente em que a palavra “tá” é mais comumente empregada em vez de “está”: se na escola ou em conversa com os amigos. O aluno também é solicitado a identificar se essa mesma marca lingüística “tá” é normalmente estudada nas gramáticas ou encontrada nos livros técnicos.
Exemplo de item:
Carta
Lorelai:
Era tão bom quando eu morava lá na roça. A casa tinha um quintal com milhões de coisas, tinha até um galinheiro. Eu conversava com tudo quanto era galinha, cachorro, gato, lagartixa, eu conversava com tanta gente que você nem imagina, Lorelai. Tinha árvore para subir, rio passando no fundo, tinha cada esconderijo tão bom que a gente podia ficar escondida a vida toda que ninguém achava. Meu pai e minha mãe viviam rindo, andavam de mão dada, era uma coisa muito legal da gente ver. Agora, tá tudo diferente: eles vivem de cara fechada, brigam à toa, discutem por qualquer coisa. E depois, toca todo mundo a ficar emburrando. Outro dia eu perguntei: o que é que tá acontecendo que toda hora tem briga? Sabe o que é que eles falaram? Que não era assunto para criança. E o pior é que esse negócio de emburramento em casa me dá uma aflição danada. Eu queria tanto achar um jeito de não dar mais bola pra briga e pra cara amarrada. Será que você não acha um jeito pra mim?
Um beijo da Raquel. (...)
NUNES, Lygia Bojunga. A Bolsa Amarela – 31ª ed. Rio de Janeiro: Agir, 1998.
Em “Agora tá tudo diferente:” (ℓ. 7), a palavra destacada é um exemplo de linguagem
(A) ensinada na escola.
(B) estudada nas gramáticas.
(C) encontrada nos livros técnicos.
(D) empregada com colegas.
Observações:
Naturalmente, essa competência (variação linguística) deve ser trabalhada na sala de aula para que os alunos possam desenvolver as habilidades de reconhecer e identificar as marcas lingüísticas empregadas nos diversos domínios sociais. Para isso, o professor deve selecionar textos que evidenciem eventos de letramento com larga utilização das variantes linguísticas. Temos, como exemplo, letras de música onde aparecem variantes de pronomes de tratamento, tirinhas, especialmente as de Chico Bento, revistas em quadrinho, trechos de diário, narrativas etc. No entanto, é de fundamental importância que o professor, ao lidar com alunos que utilizam exemplos da língua não-padrão, identifique as diferenças e conscientize os alunos quanto a essas diferenças.
Referência
http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/prova%20brasil_matriz2.pdf